Leituras da semana
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Queridos amigos,

Quando se fala em desmoronamento ou em erosão, vem clarividente a imagem de tudo o que já aconteceu e que se repete, não apenas no Haiti, mas em diferentes partes do mundo, seja em lugares mais ricos, seja nos mais pobres, em lugares pouco ou muito populosos. Todos tem suas misérias.

A diferença é que, no Haiti, o desmoronamento já havia começado muito antes. E ninguém via. Antes que o chão cedesse, os olhares desesperançados. E ninguém via. Antes que os prédios partissem, a alegria já estava partida. Mas ninguém olhava, aliás, ninguém ousava olhar. Antes, muito antes que as crianças perdessem seus pais, eles já estavam perdidos.
E agora mais ainda - agora, para sempre.

Mobilizar-se nesse momento é como que aguar a planta seca, depois que ela morreu à míngua. É como passar um pano limpo nessa culpa que invade e pergunta, todo dia, o que se fez com aqueles que desmoronavam e secavam por omissão, e que agora terminaram de ser enterrados.

Desmoronamentos não acontecem apenas nas camadas mais fundas do mundo. A erosão não carrega apenas a terra solta em enxurrada. Antes disso, já desmoronavam vidas demais e a falta de esperança varria a beleza do pouco que se havia para admirar.

A miséria no Haiti não é pior do que a miséria na África, não é pior que tantas outras misérias, não é pior que a adolescência indiana se perdendo a cada ano por suicídios sem motivo, não é pior que a infância fumando crack nas esquinas de Copacabana.

Além de doar o que se pode, ajudar para aliviar a tristeza, é preciso, antes de tudo, começar a ver.

Ver, antes que tudo desmorone.



Dicas da semana (30.01.2010 a 05.02.2010)
Lançamentos

- na terça, dia 2, o 'Saara Rio de Janeiro', que mostra o nosso Saara em fotos, será autografado às 18h na Travessa do CCBB. No mesmo dia, Mariana Várzea e Roberto Ainbinder lançam o livro 'Arte Ambiente Cidade - Rio de Janeiro', revelando a beleza monumental da arte pública carioca, às 19h no quiosque Palaphita Kitch (Parque do Cantagalo, Lagoa). Flávio Braga, às 19h30 na Travessa do Shopping Leblon mostra, em debate, e autografa 'O olhar cingido' do espectador brasileiro.

- quarta, Alberto Mussa e Luiz Antonio Simas assinam 'Samba de enredo - História e arte'. às 18h no Al-Farabi. Na Travessa do Shopping Leblon, Amaury Souza exibe seus estudos sobre 'A classe média brasileira'.

- dia 4, quinta-feira, Eduardo Ponte Brandão adapta sua tese de doutorado 'Nem Édipo nem barbárie: genealogia dos laços entre aliança e sexualidade' para livro, e autografa na Cândido Mendes do Centro às 18h.

 

Eventos, cursos e concursos

- estão abertas as inscrições para a nova turma de 'Oficina de Criação Literária' de Esdras do Nascimento. A oficina acontece às terças-feiras, de 15 às 17hs, no Flamengo, Estação Largo do Machado. Nesta oficina, serão trabalhados os contos do Raymond Carver, 'Os segredos da ficção', de Raimundo Carrero, bem como os textos dos participantes. Informações pelo telefone (21)2285-1682. 

- na Estação das Letras, a poeta Eunice Arruda inicia o curso sobre haicai, enquanto o jornalista, escritor e poeta Felipe Pena ensina a redigir crônicas.

- continuam abertas as inscrições para o 5º Concurso Internacional de Minicontos Mulheres Emergentes. Os trabalhos devem ser inéditos e escritos em português ou espanhol. Tânia Diniz, a organizadora, exibe o Regulamento no blog das ME

- A programação da Sala de Música desta semana convida Alexandre Gismonti e vai ao ar no domingo, às 23h na MEC-FM 98.9. Na MEC-AM 800, o programa é repetido na quarta, 23h e no domingo, às 16h. 

 

Novidades

- O amigo e escritor Mauro Siqueira divulga o novo blog coletivo O Bule. (...)

 



- Para quem perdeu as notícias sobre o Forum de Davos, Márcio Fortes envia o link para sua entrevista na GloboNews, edição das 10h do dia 26.01.


- Curabula Livro Clube anuncia os primeiros posts de 2010, no momento, imersos em clássicos.

- A Confraria do Vento não pára. Lança no dia 2 de fevereiro de 2010, no clima pré-carnavalesco de Recife, o livro "Diário de Sintra: reflexões sobre o filme de Paula Gaitán" (...)

- Destaque para o novo livro de Fabrício Corsaletti, 'Esquimó', com 60 poemas escritos entre 2006 e 2009, que se articulam e conversam entre si. Vale conferir. 

 

Fontes: caderno Prosa&Verso, jornal O Globo, suplemento Ideias&Livros, Jornal do Brasil, PublishNews e mailing pessoal da autora.

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A casa da maresia - parte 3


Na cabeça dele, a maresia da casa ia comer o que viesse pela frente, e por isso tinha que levar pouca coisa. Pouca coisa para se desmanchar. Só o que ele pudesse perder.





Foi logo abrindo a maior bolsa que tinha, a mochila gigante do colégio, surrada do ano inteiro. E colocou lá dentro um par de cada: sunga, camisa, bermuda, pijama, cueca, chinelo. Além da escova de dentes e da escova de cabelo. E um joguinho eletrônico velho. Só para o caso de ficar sem nada para fazer. Ou do tio ser desatento igual ao pai.

Pronto. Nem encheu a mala. Podia perder tudo aquilo que não faria mal.

A viagem durou algumas horas. Ele foi caladão na janela, apreensivo, enquanto o tio tagarelava e fazia adivinhas. Como é que aquele tio era tão feliz, na tal casa da maresia? Isso o menino não sabia. Nem desconfiava. Mas ia descobrir.

- Pronto, chegamos. Tá sentindo o cheiro? - o tio abria os braços no meio da sala.
- Do quê?
- Da maresia, olha que delícia! - e ele fungava forte e expirava com força.

A casa não tinha quase nada, bem diferente do apartamento cheio de tudo. Ela era bem vazia e clara, cheia de brisa, de luz e daquele cheiro salgado. Em cima das mesas, conchas gigantes espalhadas, estrelas do mar penduradas na parede, barquinhos de madeira colorida, potes com a areia branca da praia. Pela janela, o mar batia com vontade numa espuma branca que levantava voo. Do lado de fora, a rede presa na árvore, de arrastão e bem gasta, balançava devagar com o vento.

Os dias passavam bem rápido, do jeito exato que o tio falou, e cada um conseguia ser mais suave que o outro, feito marola de lagoa. Cada dia eles seguiam para visitar um canto diferente, iam explorar o final de uma praia, iam andar de traineira, pescar de madrugada, limpar mexilhão, coser os furos da rede.

Sempre tinha coisa diferente para fazer.

E numa das noites em que eles vigiavam juntos a lua, o tio, antes de dormir, contou um segredo. 


... a continuar.

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O óbvio dos sábios

- Paes, Victor. O óbvio dos sábios. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2007.

 

Victor Paes pauta sua poesia pelo teatro. 'O óbvio dos sábios', seu primeiro livro de poesia, publicado em 2007, é montado sobre o tablado numa espécie de formato 'stand-up poetry', o que por si só já é um estímulo desafiador.

Claro que esse óbvio de sábios pede para ser decifrado pelos não-sábios que os leem. Esta é apenas a porta de entrada, a chamada inicial para o duelo (ou dueto) que vai se montar dentro e fora do livro. Como Fernando Bonassi pede, na 'Introdução ao óbvio', eu começo abrindo o que tenho nas mãos.

Eu abro. Estruturado em dois tempos, o livro em seu primeiro ato (ou Tempo) vem formado de duelos que Victor e seu leitor vão atravessando, um a um, até que se chegue a um tempo de paz, ou seja, um tempo sem duelos, o Tempo 2.

Várias de minhas perguntas ficaram sem resposta. Como toda mulher, a princípio fiquei bastante irritada por não descobrir 'o que o autor está pensando'. Seria possível que talvez não existisse apenas uma resposta, e que eu tivesse de procurá-las em mim mesma? Seria possível que talvez não houvesse resposta alguma, já que se eu a desvendasse, isso faria de mim uma sábia? Assertivas provavelmente inválidas. Perdi para a esfinge e agora receio ser devorada. Sinto uma vontade infinita de chamar Fernando, ou até Victor, aflita para que eles me expliquem 'a complexidade do que é tão simples.' e que me fugiu, desestruturando um mundo de ideias e conceitos simples e óbvios.

No entanto, algumas janelas se abriram, e talvez só isso já tenha valido minha travessia. Apesar de não decifrar o livro como um todo, reparo sentidos no texto, sim, e eles aparecem como lampejos entre uma ou outra proposição desnorteadora. Entre fragmentos que despistam, eis que a poesia surge, confundindo os olhos do leitor.  (...)


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Um beijo,
mas dessa vez,
não vou fechar os olhos.

Paula