Leituras da semana
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Queridos amigos,

Dias instáveis anunciam os meados da primavera, desenrolada entre nuvens recortadas de azul e cinza. Não há sol firme para ir à praia, não há frio bastante para puxar o cobertor, e então saio a passear nas Paineiras, numa estrada pavimentada na floresta densa, ladeada por paredes de pedra e quedas d'água, onde as árvores coam a luz do sol e suavizam o calor abafado dos dias.

O mais interessante nessa estrada é procurar pelas enormes borboletas azuis, que adejam de um jeito pesado, dificultoso, como se as asas fossem grandes demais, desproporcionais para seu minúsculo corpo negro, ou como se singrasse o ar mais denso e úmido daqueles caminhos da floresta.

Eu cresci vendo a primavera tomar corpo nessas enormes borboletas azuis e sempre que se avistava uma, era aquela gritaria, aquele alvoroço, como se avistássemos uma coisa rara, uma preciosidade que bate asas entre a luz e a sombra.

As borboletas não voam, meu avô dizia, elas adejam. Mas quando uma chegava bem próximo, pousava na minha mão e me permitia ver o pó brilhoso e furta-cor de suas asas, era eu quem adejava, pelo resto todo da primavera.



Dicas da semana (24.10.2009 a 29.10.2009)
Lançamentos 

(...)

- terça, 27, Anderson Pires da Silva exibe a biografia 'Mário e Oswald - Uma história privada do modernismo', às 19h no Bar Belmonte (Jardim Botânico, 617), e Erasmo Carlos assina 'Minha fama de mau', às 20h no 00 Cozinha Contemporânea (Planetário da Gávea).

- quarta, 28, Jorge Dias Souza, às 19h na Travessa do Barrashopping, autografa 'As chefias avassaladoras', enquanto Márcia Castro Lopes mostra sua 'Solidariedade', às 19h na DaConde.

- quinta, 29, Mara Bergamaschi lança 'Acabamento', às 19h no Espaço Maurice Valansi (Martins Ferreira, 48), Sonia Hirsch lança sua 'Amiga cozinha', às 19h na Travessa do Leblon, e Rudi Werner lança 'Beleza - um bom negócio', às 19h na Travessa de Ipanema.
 

Eventos, cursos e novidades

>> a partir de 29.10 até 10.12, na Estação das Letras, o curso 'Introdução à obra do gigante do romance moderno: Balzac', em que Cecília Costa - editora-assistente da Revista do Livro da Biblioteca Nacional -  abordará a romântica vida de Balzac (...). Também na Estação das Letras, Cláudio Aguiar ensina 'Como se faz uma biografia' (...). É bom correr!

>> em novembro de 2009, o escritor cearense Moacir Costa Lopes comemora 50 anos de carreira. Seu livro mais conhecido é 'A ostra e o vento', adaptado para o cinema nacional por Walter Lima Jr. (...) Vale conferir o site do Moacir. 

(...)

>> Laurentino Gomes na Casa do Saber: 'Os franceses e o Brasil', dias 26 e 28, às 20h.

>> a partir do dia 26.10 até 30.10, a Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo.

>> O Clube das lambidas, organizado pela amiga Verônica Fernandes e suas amigas, ganhou entrevista no jornal Correio Carioca. Mas não é nada erótico, não. Elas recolhem cães abandonados, cuidam, promovem a esterilização do animal, e encontram um lar para o bichinho. Ah, e não param no 'felizes para sempre' - elas acompanham todo o restante da história. Quase tão bom quanto o filme da Disney, 'Hotel bom para cachorro'. O blog super útil: www.clubedaslambidas.blogspot.com

>> Livre-se: Simpósio do Livro da UFRJ, nos dias 27, 28 e 29 de outubro no Auditório Machado de Assis, na Biblioteca Nacional. No dia 27, Aníbal Bragança, Jaime Mendes, Marcelo Martinez, Márcio Gonçalves, mediados por Paulo Cesar Castro, debatem 'A história do livro'. Dia 28, a palestra é 'O livro e a leitura' e, no dia 29, 'O acesso ao livro'. Na programação do evento também está previsto o Café do Dia, com João Gilberto Noll (dia 27) e Ferreira Gullar (dia 29). Inscrições pelo site www.livrese.com.

>> o amigo e professor da UFRJ, Enzo Bello, informa a publicação do livro 'Direito e Marxismo' (...)

>> dia 28.10, às 21, no Circo Voador, Clauky Saba chama para o show 'Faz Cinco Bocas Que Eu Não Te Beijo', com performance de 'Elllas & os Monstros' no MoLA. A entrada é franca das 20h as 21h30. (...)

>> ah, e do dia 29 em diante, as dicas serão do Forum das Letras, em Ouro Preto!

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Fontes: Caderno Prosa&Verso, jornal O Globo, Suplemento Ideias&Livros, Jornal do Brasil, e mailing pessoal da autora


Escutando os vinis de Ramon Mello


- Mello, Ramon. Vinis mofados. Rio de Janeiro: Língua geral, 2009.

 
Uma moça que eu nem conhecia se dirigiu a mim, a última na fila enorme de autógrafos e perguntou sorridente 'Ele tem prestígio, né?'. Atônita, eu não pude responder à pergunta feita à queima roupa.

Ainda sem o autógrafo, com o primeiro livro de Ramon Mello nas mãos, orelha de Heloisa Buarque de Hollanda, reparo que ele foi montado poeticamente como um LP e isso me fez atinar que o LP não é a mera união de lados, mas em essência é um objeto dual, contraposto, verso e reverso, o que de logo convida intuitivamente à sedução de mudar de tom.


É bom lembrar que, após o LP com sua divisão dúplice, frente e verso, veio o CD, planificado, uno, uma face de exibição, outra em que se revelava o conteúdo decodificado. E, mais recentemente, a dualidade se perdeu por completo e os arquivos digitais, que substituíram o suporte físico da música, encerram uma virtualidade latente, uma quase inexistência, uma imaterialidade que os define e caracteriza. Ramon escolheu a razão de ser do LP e, a partir disso, dessa constatação prévia e não menos profunda, eu fechei o livro. Respirei fundo. Poderia continuar a leitura mais tarde, confortável na minha poltrona preferida.


A primeira parte, o Lado A, é mais seco e mais áspero. Contundente, é o limão chupado depois da tequila. Nele, sobreleva o poema concreto, substantivo, por vezes até visual. Talvez em superfície, em primeira apresentação, todos nós sejamos assim também, menos palavrosos, menos blues e mais rock'n'roll. 

No Lado A de Ramon, o poeta se permite mais, diverte-se com o ato formal do ouvir a música, exibindo seus próprios botões: play, repeat, rec. E vai, assim, dando pistas sobre o que ele escuta, o que é preciso repetir para refletir ou sublinhar, o que de precioso ele precisa gravar para que não se perca nunca. 


Remix, ipod, master system, stereo, todas essas figuras são mixadas à poesia, que vai assimilando outros símbolos, ritmos de um tempo novo. Não se trata apenas de uma releitura ou remasterização dos 'Morangos mofados' de Caio Fernando Abreu, mas uma breve remissão do que sensibiliza o poeta, uma de suas tantas influências músico-literárias. Assim como ele, para escrever também eu lanço mão de algumas músicas preferidas, músicas de despertar poesia.


No Lado B, Ramon muda o disco e altera o diapasão. (...)

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O pirata enrustido

"Ai daquele que edifica a sua casa com injustiça, e os seus aposentos sem direito, que se serve do serviço do seu próximo sem remunerá-lo, e não lhe dá o salário do seu trabalho." Jeremias 22.13

 
Ele bate no peito, jura que o crime passa ao largo de sua porta. Compra com dificuldade, mas compra original. Mais que tudo, desvia dos camelôs que o interpelam com seus produtos expostos no chão, no plástico amarrado feito pipa para ajudar a correr da polícia. Como se passasse pelas portas do inferno e sentisse o calor das labaredas, e vira a cara.

Um pai de família, classe média. Nunca precisou roubar ninguém. Sua honra era o maior valor, o bridão que soava ao proclamar seu nome, a certeza do mea culpa bem feito a hora da missa.

O computador da família era todo original, comprado nas Casas Bahia. Se não dava para parcelar a despesa com o antivírus, comprava no cartão do banco e parcelava com juros rotativos. Mas não macularia suas convicções. Até que.

Até que lembrou-se de um show raro do Marvin Gaye. 1976. A música que a mãe escutava e, por vezes, o emocionava ao tocar de sopetão no rádio, Goodtimes 98, com uma das mais lindas traduções.

Flertando no email funcional, confessou à colega de trabalho que era sua música preferida, 'I want you', e soube dela que existia aquela música na internet, no Youtube.

No Youtube? ele gelou. Ouviria de novo a música da sua mãe, justo a que ela costumava ouvir na fita cassete. O primeiro presente que ele pôde lhe dar sem pedir dinheiro ao pai. A primeira fita cassete que ele gravou do rádio. Goodtimes.

Entrou lá, youtube ponto com, e pesquisou marvin gay (assim mesmo, sem o 'e') e a pesquisa lhe retornou preciosos resultados, resultados que foram minuciosamente analisados enquanto quase tremia de saudade naquele relembrar sem fim.

Encontrou, com um pouco mais dificuldade, o Rick Astley, a primeira música que dançou com uma menina no play do seu décimo-quarto aniversário.

E então, insatisfeito com a parcialidade dos resultados, jogou os nomes anotados e salvos num arquivo txt no desktop, direto na internet, na caixa de pesquisa do Google.

Rapidshare.

a continuar...
Uma semana bela, brilhosa e furta-cor para todos
e o meu beijo
pousado na mão,
Paula